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13 de novembro de 2017

Um Cão de Lata ao Rabo - Machado de Assis (conto)


Contos Escolhidos - 10/30

Machado de Assis é um dos mais renomados contistas da literatura brasileira. Transitando entre os diversos tipos de contos - do tradicional ao moderno -, seus textos são originais e complexos. São contos cheios de acontecimentos intensos - quase sempre envolvidos num clima de tensão -, repletos de personagens polêmicos e ambíguos e de jogos e armadilhas textuais que induzem à dúvida, relativizando a maior parte das ideias e levando o leitor a refletir sobre suas "certezas". 


Palavras de uma leitora...



- É após ler um conto como este que uma pessoa percebe que está ficando burra. 

Eu estava toda empolgada, cheia de ilusão, ansiando pelo momento em que leria um conto do Machado. Depois de mais de um mês sem ler nada dele já estava morrendo de saudades. Antes não tivesse lido.kkkkk... Porque antes mesmo de terminar a leitura de Um Cão de Lata ao Rabo já notava que as coisas estavam caminhando para um final nada agradável... para mim. 

Tudo começa aparentemente bem. O narrador tenciona nos contar a história de um concurso literário em que determinados alunos teriam quinze dias para dar o melhor de si, criar grandes obras ou ao menos tentarem. Seria estabelecido um corpo de jurados que julgaria os trabalhos e escolheria os melhores textos. Até aí tudo bem, não é mesmo? 

O narrador, que nos conta também que fazia parte desse júri, relata que apenas três trabalhos se destacaram. E, encantado por eles, resolve dividi-los com nós leitores.... É a partir daí que tudo desanda. E eu começo a boiar. Não. Esta não seria a palavra. Afundar parece mais apropriado. 

Sério! O que diabos foi aquilo? Não entendi absolutamente nada!kkkkkkkkkk... E terminei a leitura me sentindo muito, mas muito burra mesmo. Como se tivesse desaprendido tudo que acreditava saber. Já posso voltar para a escola. rsrs

Notei uma certa crítica à Educação no conto, mas não compreendi muito o sentido dos três textos "literários" dos alunos. Todos pareceram sem sentido para mim. Apenas um apanhado de palavras rebuscadas (no último), uma introdução sem fim (no segundo) e um emaranhado de frases de efeito (no primeiro). Mas todos os três textos tinham um grande "nada" de sentido. Ou então estou mesmo burra. :( 

Talvez deva reler o texto num momento em que não esteja com a mente tão cansada (após ter feito uma das piores provas da minha vida) para ver se assim consigo compreendê-lo. Até porque nem todo texto conseguimos compreender de primeira.rs Ou quem sabe a alternativa seja mesmo voltar a estudar... começando por Interpretação de Texto. 

Um Cão de Lata ao Rabo não fez nenhum bem para a minha autoestima.kkkkkkk... Se a intenção do autor era fazer com que eu me sentisse uma ignorante, ele conseguiu.rsrs 


Contos anteriores:

13 de setembro de 2017

O Enfermeiro - Machado de Assis (conto)


Contos Escolhidos - 9/30

Machado de Assis é um dos mais renomados contistas da literatura brasileira. Transitando entre os diversos tipos de contos - do tradicional ao moderno -, seus textos são originais e complexos. São contos cheios de acontecimentos intensos - quase sempre envolvidos num clima de tensão -, repletos de personagens polêmicos e ambíguos e de jogos e armadilhas textuais que induzem à dúvida, relativizando a maior parte das ideias e levando o leitor a refletir sobre suas "certezas". 



Palavras de uma leitora...


- Faz quase um mês que não leio nada do Machado de Assis e sentia muita falta. Com seus contos, ele já se tornou um dos meus autores preferidos. Imagina quando ler seus romances!rsrs

A história é contada pelo protagonista, através de uma carta, uma espécie de confissão antes de sua morte. Ele estava no fim de suas forças, mas esperava que o autor para o qual escrevia publicasse sua história desde que após sua morte. Algo que aconteceria dali a talvez um pouco mais de uma semana. 

Com suas palavras, somos levados ao ano de 1860, quando ele era ajudante de um padre e lhe ofereceram um emprego de enfermeiro no interior, para tomar conta de um coronel muito doente e difícil. O homem era extremamente violento, fosse pela doença ou por uma natureza cruel, e ninguém conseguia trabalhar por muito tempo naquela casa. Vários enfermeiros tinham antecedido Procópio, nosso protagonista, mas ele acreditou que tiraria de letra, pois não tinha medo de nada, muito menos de um velho doente e ranzinza. 

Para sua surpresa, o coronel o recebeu bem e durante uma semana tudo parecia fácil. Mas no oitavo dia...

"No oitavo dia, entrei na vida dos meus predecessores, uma vida de cão, não dormir, não pensar em mais nada, recolher injúrias e, às vezes, rir delas, com um ar de resignação e conformidade"

Com o tempo, as coisas só pioraram. As agressões verbais se tornaram físicas e toda vez que Procópio pensava em ir embora, o doente suplicava para que ele ficasse, que nunca mais faria o mesmo, que precisava dele, que estava morrendo... Deixando-se levar pelas palavras do coronel, ele ia ficando... Até que um dia, as coisas mudaram de uma maneira definitiva...

- Nunca me canso de admirar o talento deste escritor. A forma como ele nos envolve já nas primeiras palavras e faz com que devoremos as páginas, que mergulhemos na vida dos personagens e não possamos esquecer suas histórias mesmo que sejam curtas, mesmo que contadas em breves contos. 

Fiquei impressionada com a história do Procópio. Confesso que imaginava que as coisas terminariam daquele jeito, tudo caminhava para um final como aquele. Ainda assim, foi um choque. 

Estou mais do que ansiosa para ler um romance do Machado de Assis. Seus contos são tão bons que cada vez fica mais difícil me segurar para ler os livros que estão na frente. Penso em começar por Dom Casmurro, uma de suas histórias mais famosas e estudadas. Mesmo sem tê-la lido já conheço o drama de Capitu.rsrs 


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Missa do Galo
Conto de Escola
Cantiga de Esponsais
Teoria do Medalhão
O Espelho
A Cartomante

A Causa Secreta
Mariana

16 de agosto de 2017

Mariana - Machado de Assis (conto)


Contos Escolhidos - 8/30

Machado de Assis é um dos mais renomados contistas da literatura brasileira. Transitando entre os diversos tipos de contos - do tradicional ao moderno -, seus textos são originais e complexos. São contos cheios de acontecimentos intensos - quase sempre envolvidos num clima de tensão -, repletos de personagens polêmicos e ambíguos e de jogos e armadilhas textuais que induzem à dúvida, relativizando a maior parte das ideias e levando o leitor a refletir sobre suas "certezas". 



Palavras de uma leitora... 


- A última vez que fiz resenha de um conto foi no dia 05 de julho. Sim, faz bastante tempo.rsrs Mas a culpa não foi minha. Foi da Maratona Literária de Inverno 2017 e da correria que foi o mês passado. As coisas ainda estão bem agitadas este mês e cheguei tão esgotada em casa que mal consigo manter os olhos abertos, mas para que o dia de hoje não ficasse sem postagem, peguei um conto do meu querido Machado de Assis pra ler. Se a resenha não tiver muita coerência, a culpa é do meu cansaço e não do conto.rsrs

"Crescera-lhe o desejo de ver Mariana. Que olhos teriam um para o outro? Que visões antigas viriam transformar a realidade presente?"

Evaristo fugiu do Brasil no ano de 1872, tendo permanecido longe durante dezoito anos. Fizera de tudo para sequer pensar em seu país e no passado que desejava enterrar, fazer de conta que nunca existira. Todavia, em 1890, já tendo ocorrido a proclamação da República no Brasil, um repórter lhe faz diversas perguntas sobre sua pátria e ele, então, decide voltar... Não definitivamente, mas apenas pelo tempo necessário para obter as informações que precisa e rever uma pessoa em especial. Justamente a mulher que o fez partir tantos anos antes... 

Era impossível pensar em seu país sem lembrar-se dela...  e do amor que um dia ele acreditou que os unia. Como será que ela estaria? Ainda viveria? Recordaria o homem pelo qual quase perdera tudo? Ainda que soubesse que era um erro, Evaristo não pôde resistir à saudade... A veria, por apenas um instante, e depois partiria outra vez... 

- Diferentemente dos outros contos que já li do autor, este é bem mais simples. Envolvente, mas comum. Daqueles para lermos sem grandes pretensões. 

Senti pena do protagonista, do fato dele nunca ter conseguido livrar-se de um amor do passado, de alguém que ele não teve outra opção senão deixar para trás. Quando amamos de verdade alguém é muito difícil esquecer tal sentimento. Não há como simplesmente apagar a pessoa dos pensamentos e do coração. Por isso, entendo o que ele sentia.


Contos anteriores:

Missa do Galo
Conto de Escola
Cantiga de Esponsais
Teoria do Medalhão
O Espelho

A Cartomante
A Causa Secreta

5 de julho de 2017

A Causa Secreta - Machado de Assis (conto)


Contos Escolhidos - 7/30

Machado de Assis é um dos mais renomados contistas da literatura brasileira. Transitando entre os diversos tipos de contos - do tradicional ao moderno -, seus textos são originais e complexos. São contos cheios de acontecimentos intensos - quase sempre envolvidos num clima de tensão -, repletos de personagens polêmicos e ambíguos e de jogos e armadilhas textuais que induzem à dúvida, relativizando a maior parte das ideias e levando o leitor a refletir sobre suas "certezas". 




Palavras de uma leitora...



- Eu fico realmente muito assombrada por este autor. Me pergunto como alguém pode chocar e impressionar tanto em pouquíssimas páginas. Seus contos me envolvem, me fazem refletir, me angustiam... me fazem sentir diversas coisas. E não possuem mais de cinco folhas cada um (edição de bolso). Não dá para negar que o Machado era brilhante como poucos, pois conseguia construir toda uma história e nos enrendar sem necessidade de se prolongar muito. Em poucos parágrafos, lá estava mais um impactante conto. O Espelho e A Cartomante me deixaram arrepiada. E agora vem A Causa Secreta para me provocar pesadelos.kkkkk...

"Como os três personagens aqui presentes estão agora mortos e enterrados, tempo é de contar a história sem rebuço."

- Belo início, não?rsrs Logo no começo, já sabemos que os três personagens deste conto não estão mais vivos no momento em que o narrador decide contar a história deles. Eu não fazia a menor ideia do que se tratava. E quando percebi... lembrei imediatamente de histórias envolvendo psicopatas. Não tenho como chamar aquele personagem de outra coisa. Ele me provocou verdadeiro pavor! Não era humano. Era alguém com grande potencial para causar danos aos outros. Alguém ruim, que sentia prazer com o sofrimento alheio. Ele levava a maldade dentro dele. E isso nos perturba ao longo da narrativa, sobretudo com uma cena em particular envolvendo um rato. Tenho quase certeza que terei pesadelos por causa daquela cena. :(

Este, sem sombra de dúvidas, não é o meu conto preferido do autor e sim o que mais me perturbou, me deixou aflita. Alguém que faz o que aquele doente fez não demoraria a repetir a experiência nas pessoas, na intenção de saciar uma curiosidade e obter o prazer com o sofrimento dos outros. Realmente um tipo que causa repugnância e medo. 

Que venha o próximo conto! :D Não lerei apenas os contos do Machado, gente! Logo, logo me aventurarei por outros autores!rs


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30 de junho de 2017

A Cartomante - Machado de Assis (conto)


Contos Escolhidos - 6/30

Machado de Assis é um dos mais renomados contistas da literatura brasileira. Transitando entre os diversos tipos de contos - do tradicional ao moderno -, seus textos são originais e complexos. São contos cheios de acontecimentos intensos - quase sempre envolvidos num clima de tensão -, repletos de personagens polêmicos e ambíguos e de jogos e armadilhas textuais que induzem à dúvida, relativizando a maior parte das ideias e levando o leitor a refletir sobre suas "certezas". 





Palavras de uma leitora... 


- Eu achava que O Espelho era o conto mais forte que tinha lido do Machado de Assis. Todavia, A Cartomante conseguiu superá-lo. 

Quem aqui nunca encontrou um "vidente" em seu caminho? Alguém que lhe revelou algo sobre sua vida, seu futuro, que disse que você seria isso ou faria aquilo? Perdi a conta de quantas vezes isso aconteceu comigo.rsrs Já disseram que eu seria cantora, que casaria aos 18 anos, que teria determinada quantidade de filhos. Nada disso aconteceu, claro. Já chegaram até mesmo a "revelar" coisas bastante duras sobre o meu futuro. E se eu desse ouvidos a essas pessoas certamente já teria me trancado num hospício, escondendo-me do mundo. Eu acredito totalmente na existência do bem e do mal e que Deus pode sim usar alguém para te "contar" algo sobre sua vida, para te auxiliar numa direção, num caminho. Mas algo que venha dEle, que seja dito por Ele. Na maioria dos casos, as pessoas fazem "revelações" por conta própria. Inventam. E aí é que está o perigo. 

Em A Cartomante, Rita e Camilo se amam. Vivem um romance proibido, pois ela é casada com o melhor amigo dele. Apesar dos obstáculos e dos perigos, não conseguem manter-se separados. E quando Camilo resolve se afastar um pouco, deixando de frequentar a casa do amigo para não levantar suspeitas, Rita, desesperada, resolve procurar uma cartomante para entender o que se passava. Será que Camilo já não a amava mais? Será que a tinha esquecido? E nada poderia ter sido mais confortador que as palavras daquela sábia mulher, que lhe tiraram um peso do peito. 

"Apenas começou a botar as cartas, disse-me: 'A senhora gosta de uma pessoa...' Confessei que sim, e então ela continuou a botar as cartas, combinou-as, e no fim declarou-me que eu tinha medo de que você me esquecesse, mas que não era verdade..."

Camilo, por sua vez, não era uma pessoa supersticiosa, não acreditava em adivinhações e muito menos era alguém religioso. Tinha crescido com uma mãe que lhe passara várias crenças, mas ao chegar na vida adulta ele se tornou alguém incrédulo, com os dois pés no chão. Achava divertido que Rita acreditasse naquelas coisas, que tenha ido consultar alguém para ter respostas sobre o futuro e o afeto dele. E isso só aumenta o seu amor por ela e o torna mais e mais imprudente. 

"Camilo não acreditava em nada. Por quê? Não poderia dizê-lo, não possuía um só argumento; limitava-se a negar tudo."

- Foi fácil perceber como este conto terminaria. Por mais que eu quisesse que as coisas ocorressem de outra maneira, tudo caminhava para aquele final. Fiquei chocada com a facilidade com que os personagens se deixaram levar. Muitas vezes a gente quer ouvir determinada coisa e se alguém chega e lhe diz aquilo, você acredita que foi uma "confirmação" do que você deveria fazer, do que pensava em fazer. Mas na verdade não passava daquilo que você QUERIA que alguém lhe dissesse. Não era exatamente o conselho ideal, o sensato, o correto, não passava do que você desejava ouvir. E isso é extremamente perigoso. 

O tempo, as experiências, as leituras... tudo contribuiu para me tornar uma pessoa mais questionadora e cética. Não que eu seja como o personagem Camilo que "não acredita em nada". Eu acredito em Deus, como todos aqui sabem. Penso que o fato deste mundo existir e de nós seres humanos e todos os outros seres viventes existirmos é mais do que uma prova da própria existência do nosso Deus. Mas Deus nos deu um cérebro, a capacidade de pensar, de raciocinar. Não podemos dar como certo e verdadeiro tudo o que as pessoas nos contam. Isso é o mesmo que ter o cérebro como enfeite, caramba! Eu fico admirada com a maneira como as pessoas preferem acreditar em tudo que ouvem, chegando a repassar informações que elas nem sequer pararam para confirmar se eram verdadeiras ou não. Mas se fosse só isso! O que realmente me choca e angustia é que existem pessoas que se deixam levar totalmente pela conversa, pela lábia dos outros, tornando-se alienadas. Eu conheço pessoas assim. Que não pensam mais por elas mesmas, que tudo que dizem ou fazem parte da influência total das palavras de outra pessoa. Isso para mim é algo muito sério. 

Sim, este conto mexeu comigo.rsrs E penso que essa era justamente a intenção do autor. Tocar num determinado assunto, alfinetar aqueles que lessem a história. Já percebi que em todos os seus contos há sempre uma sutil (ou não tão sutil assim) crítica à sociedade. E gosto bastante disso! :)

- Infelizmente, este mês só consegui ler dois contos. Espero que no próximo consiga ler os quatro que pretendo! 


Contos anteriores:

Missa do Galo
Contos de Escola
Cantiga de Esponsais
Teoria do Medalhão
O Espelho

7 de junho de 2017

O Espelho - Machado de Assis (conto)


Contos Escolhidos - 5/30

Machado de Assis é um dos mais renomados contistas da literatura brasileira. Transitando entre os diversos tipos de contos - do tradicional ao moderno -, seus textos são originais e complexos. São contos cheios de acontecimentos intensos - quase sempre envolvidos num clima de tensão -, repletos de personagens polêmicos e ambíguos e de jogos e armadilhas textuais que induzem à dúvida, relativizando a maior parte das ideias e levando o leitor a refletir sobre suas "certezas". 



Palavras de uma leitora...


- Já são quase meia-noite. E tenho que acordar às quatro da manhã, pois tenho prova. Mas estou aqui fazendo resenha.kkkkk.. Não sou normal. Tenho certeza disso! 

Graças a Deus, meu computador voltou a funcionar! :D Isso significa que sexta-feira, se tudo der certo, estarei publicando a resenha de O Diário de Anne Frank, uma história que mexeu muito com as minhas emoções e ainda não sei o que irei ler, pois não paro de pensar na Anne, em tudo o que ela viveu, os sonhos, as esperanças... e seu inaceitável fim. Ela não sai da minha cabeça. A ambição, o amor pelo poder e a maldade humana destruíram a vida de uma garota brilhante que tinha muito o que ensinar. Enfim... 

Mas este post é sobre o conto O Espelho, então vamos a ele! :)

- O conto nos traz cinco amigos que reunidos conversavam e debatiam sobre diversas questões, em especial a natureza humana. Na realidade, apenas quatro deles debatiam. O quinto, silencioso, apenas pensava, observando e recusando-se a fazer parte da discussão. Ele detestava discutir, preferindo então manter-se calado. 

Todavia, naquela noite em especial, seus amigos não lhe deixaram em paz e ele aceitou partilhar sua opinião sobre a alma humana, relatando algo que ocorreu com ele, vários anos antes e que foi extremamente significativo. 

"Cada criatura humana traz duas almas consigo: uma que olha de dentro para fora, outra que olha de fora para dentro..."

Partindo dessa impactante afirmação, Jacobina começou a contar aos outros o que lhe aconteceu, quando ele tinha então somente vinte e cinco anos... Tal foi a curiosidade dos cavalheiros ali presentes, que ninguém se atrevia a debater, apenas ouviam, fazendo perguntas que o incentivasse a continuar falando... Totalmente absorvidos pela história, esqueceram-se de tudo...

Jacobina era um jovem pobre quando acabou por ser nomeado alferes da Guarda Nacional. Todos os que o conheciam ficaram muito impressionados e a partir daquele momento mal recordavam seu nome, chamando-o sempre de "alferes", "senhor alferes", fosse com orgulho, admiração, inveja ou respeito. O comportamento das pessoas à sua volta, a maneira como passaram a tratá-lo por conta da nova posição influenciaram muito a forma como o próprio Jacobina passou a ver-se e, ele sequer poderia recordar quando aconteceu, de repente não era mais ele mesmo, um ser humano, mas tão somente um alferes. Os sentimentos humanos,as emoções, tudo foi desaparecendo...

"As dores humanas, as alegrias humanas se eram só isso, mal obtinham de mim uma compaixão apática ou um sorriso de favor. No fim de três semanas, era outro, totalmente outro. Era exclusivamente alferes."

Conforme ele prossegue, dividindo com seus companheiros e também com nós leitores a experiência que viveu naquela época, mais absorvidos ficamos, sem saber ao certo como aquilo terminaria. É incrível a maneira como nos impressionamos. Eu fiquei bastante perturbada com este conto.kkkkkk... Me deu arrepios o seu final e entendi por que o título é "O Espelho".rs 

O conto me fez refletir bastante e tendo a concordar com o Jacobina. Nisso de termos duas almas. De termos duas personalidades. A interior, aquilo que realmente somos e muitas vezes estamos tão influenciados pela visão que os outros têm de nós que nem sequer conseguimos enxergá-la mais. E nossa alma exterior, que é a forma como nos vemos a partir da visão que os outros têm de nós ou ainda a personalidade que mostramos aos outros, a "máscara" que usamos no dia a dia. A teoria dele faz todo o sentido. Às vezes eu mesma fico pensando, me perguntando quem de fato sou.kkkk... Quem nunca fez isso?rs

- Quem somos? Aquilo que mostramos para os outros? A pessoa que sorri escondendo problemas, que concorda quando quer discordar, que se cala quando quer falar? Somos realmente o que mostramos ou somos aquilo que escondemos, que temos medo ou vergonha de ser? Ou ainda: somos aquilo que os outros veem quando olham para nós? São questões que o conto levanta, são perguntas que nos fazem refletir... 

O mais perigoso de tudo... e também o mais triste... é quando nos tornamos aquilo que os outros dizem que somos. As pessoas viam Jacobina como nada além de alferes. Era algo importante, claro. Mas só o viam assim. Não viam a pessoa, o ser humano. E, com o tempo, Jacobina não mais se via como algo além de alferes. Ele perdeu sua essência. Já não era capaz de ver a si mesmo. Somente o que os outros viam. Isso é chocante. E, se pararmos para pensar, muito real. 


Contos anteriores:

Missa do Galo
Conto de Escola
Cantiga de Esponsais
Teoria do Medalhão 

31 de maio de 2017

Teoria do Medalhão - Machado de Assis (conto)


Contos Escolhidos - 4/30

Machado de Assis é um dos mais renomados contistas da literatura brasileira. Transitando entre os diversos tipos de contos - do tradicional ao moderno -, seus textos são originais e complexos. São contos cheios de acontecimentos intensos - quase sempre envolvidos num clima de tensão -, repletos de personagens polêmicos e ambíguos e de jogos e armadilhas textuais que induzem à dúvida, relativizando a maior parte das ideias e levando o leitor a refletir sobre suas "certezas". 



Palavras de uma leitora...


- Sim. Sigo tendo como companhia, presente na minha bolsa onde quer que eu vá, o livro Contos Escolhidos do meu já querido Machado de Assis. 

Eu já tinha notado antes como são diferentes uns contos dos outros. Falam de assuntos diversos e ainda assim conseguem prender nossa atenção, nos cativar. Porém, confesso que tive problemas com o conto Teoria do Medalhão.rs

A grande diferença dele para os outros é que é todo composto por diálogos. Não há narrativa. Acompanhamos somente uma conversa entre um pai e seu filho. E mesmo assim, o conto me prendeu. O problema é que não estava conseguindo compreendê-lo.kkkkkk

- A linguagem dele é um pouco mais difícil do que a dos outros. Já li textos "difíceis", mas achei esse muito mais. Todavia, essa foi minha primeira impressão, quando o li dias atrás. Mas hoje eu resolvi voltar a lê-lo para só então fazer a resenha. E aí sim o entendi. Pelo menos, acho que sim.kkkkkkk...

"[...] Mas, qualquer que seja a profissão da tua escolha, o meu desejo é que te faças grande e ilustre, ou pelo menos notável, que te levantes acima da obscuridade comum."

- Que pai não deseja isso para o seu filho, não é mesmo? Todos os pais (pelo menos os dignos de serem chamados assim) querem o melhor para seus filhos; que se tornem grandes pessoas, que tenham uma vida agradável, estável, que se realizem pessoal e profissionalmente. E até aí, tudo bem. Eu achei que o conto seguiria esse caminho. Seria uma conversa amigável entre pai e filho, onde o segundo receberia valiosos conselhos para se tornar um grande homem, uma pessoa "de bem". E, de certa forma, essa realmente era a intenção do pai dele.

Eram onze da noite. Janjão e seu pai tinham acabado de se despedir dos convidados para o jantar (é o que entendemos pelo início da conversa). O pai estava muito orgulhoso de seu filho, antes um menino traquinas e agora todo um homem aos seus vinte e um anos. Alguém diplomado com várias possibilidades pela frente. Mas ele percebe possuir a "importantíssima" obrigação de orientar seu garoto para que ele tome o caminho certo. Segundo o que ele (o pai) acredita ser certo, claro. 

E é aí que eu comecei a estranhar as coisas.kkkk... Mesmo na primeira leitura (quando estava tendo dificuldades com o texto), pude notar a ironia presente nas palavras, o que de fato aquele pai queria ensinar ao seu filho. Todo o inverso de um "bom caminho", por assim dizer. Na verdade, ele considerava o filho um imbecil e queria lhe ensinar um ofício de aparências. Uma fachada, sabe. 

" - Tu, meu filho, se me não engano, pareces dotado da perfeita inópia mental, conveniente ao uso deste nobre ofício."

- Que elogio, não é?rs Ele meio que chamou o filho de retardado mental, idiota, algo do gênero. O que tornava Janjão perfeito para o ofício que seu pai queria lhe ensinar: o de Medalhão. O de ser alguém que vive de aparências, dizendo o que os outros querem ouvir, repetindo conhecimentos que não foram adquiridos por ele mesmo, mas sim apenas repetidos mecanicamente. Em resumo, alguém que não pensa, que é pura máscara, artifícios e futilidades. O que nos faz perceber que este conto, estruturado de maneira tão distinta, é uma crítica recheada de ironias. Uma crítica não só à sociedade, mas à política. Eis aí um assunto no qual não irei me aprofundar, obviamente.rs 

"[...] mas proíbo-te que chegues a outras conclusões que não sejam as já achadas por outros. Foge a tudo que possa cheirar a reflexão, originalidade etc, etc."

- Considerando que Machado de Assis era conhecido pela ambiguidade proposital de seus textos e que não sou nenhuma estudiosa do gênero nem nada, a conclusão à qual cheguei pode estar equivocada ou não ser o que a maioria entende. Enfim... Mas achei o texto extremamente inteligente, divertido pela ironia presente em cada trecho, em que cada palavra que saía da boca do pai de Janjão. E enxerguei uma crítica sutil e ao mesmo tempo bastante clara à sociedade que se deixa enganar, que ouve exatamente aquilo que quer e se deixa iludir por tipos como Janjão, dados à falácias, que têm muita lábia. No fim, não fiquei com a sensação de que o pai do "brilhante" indivíduo o via como alguém tão idiota assim. Na verdade, ele via no filho as qualidades necessárias para fazê-lo enganar os verdadeiros imbecis: toda a sociedade. Mas esta é apenas a minha opinião. Acredito que o texto é aberto à interpretações.rs

- Não é meu conto preferido do livro, mas gostei muito. E já estou ansiosa para ler os próximos. :)


Contos anteriores:

Missa do Galo
Conto de Escola
Cantiga de Esponsais

26 de maio de 2017

Cantiga de Esponsais - Machado de Assis (conto)


Contos Escolhidos - 3/30

Machado de Assis é um dos mais renomados contistas da literatura brasileira. Transitando entre os diversos tipos de contos - do tradicional ao moderno -, seus textos são originais e complexos. São contos cheios de acontecimentos intensos - quase sempre envolvidos num clima de tensão -, repletos de personagens polêmicos e ambíguos e de jogos e armadilhas textuais que induzem à dúvida, relativizando a maior parte das ideias e levando o leitor a refletir sobre suas "certezas". 



Palavras de uma leitora...


- E aqui estou eu de novo hablando de cuentos.rs A culpa não é minha, gente. O Machado de Assis simplesmente me enfeitiçou com contos tão perfeitos e irresistíveis! Já sei que em breve serei fã incondicional deste escritor maravilhoso. 

"Quem não conhecia mestre Romão, com o seu ar circunspecto, olhos no chão, riso triste e passo demorado? Tudo isso desaparecia à frente da orquestra; então a vida derramava-se por todo o corpo e todos os gestos do mestre; o olhar acendia-se, o riso iluminava-se; era outro."

- Este conto nos leva ao início do século XIX, ano de 1813. Somos apresentados ao nosso triste protagonista, conhecido por todos como mestre Romão. Alguém muito querido pela Igreja e os vizinhos, mas que sentia um vazio em seu interior. Uma necessidade que lhe roubava a alegria. 

"[...] mas a verdade é esta: a causa da melancolia de mestre Romão era não poder compor, não possuir o meio de traduzir o que sentia." 

Ele amava a música. Como poucos. Era nela que encontrava consolo e agonia. Felicidade e profunda tristeza. Preenchimento e vazio. Sim, sensações, sentimentos contraditórios, mas que estavam sempre presentes. Porque sua maior angústia era o fato de não conseguir expressar, colocar em palavras as composições que estavam em seu interior, em sua alma. Era não conseguir passá-las para o papel e então tocá-las para que o mundo conhecesse aquelas melodias que tocavam em sua mente. 

"Parece que há duas sortes de vocação, as que têm língua e as que a não têm. As primeiras realizam-se; as últimas representam uma luta constante e estéril entre o impulso interior e a ausência de um modo de comunicação com os homens."

E como se não bastasse o sofrimento de ser apenas um intérprete das composições de outras pessoas, quando sua alma fervilhava com diversas ideias, om várias melodias, o pior de tudo era jamais ter conseguido terminar um canto esponsalício, um que começara tantos anos antes, poucos dias depois de casar-se. Um que gostaria de ter dedicado à mulher da sua vida. E se na vida tivesse a chance preciosa de concluir apenas uma composição, seria aquela.  

- Até agora este foi o conto com o qual mais me identifiquei. O mais triste e maravilhoso que li. Talvez todo escritor, profissional ou não, já passou por uma fase de bloqueio. Você tem a inspiração, sabe exatamente o que quer transmitir e como quer fazê-lo, mas na hora de colocar no papel... não sai! Ou, às vezes, até sai, mas não da maneira que você queria. Não daquele jeito que você imaginou, que deseja. Ai, gente! Eu já vivi isso tantas e tantas vezes.kkkkkk... Teve um trecho do conto que me deixou os olhos cheios de lágrimas, pois parecia que eu estava realmente na pele do protagonista, sentindo o que ele sentia. E como o compreendi! É realmente desesperadora a sensação de inutilidade, de incapacidade que tal bloqueio provoca. O que o mestre Romão sentia é completamente compreensível e muito triste. Não desejo isso para ninguém.

E o final do conto? Não quero ser uma estraga-prazeres e contar tudo. Só posso dizer que queria que terminasse de outra maneira. 

"Como um pássaro que acaba de ser preso, e forceja por transpor as paredes da gaiola, abaixo, acima, impaciente, aterrado, assim batia a inspiração do nosso músico, encerrada nele sem poder sair, sem achar uma porta, nada."


Contos anteriores:

Missa do Galo
Conto de Escola


Se você está lendo esta resenha agora, então já é sexta-feira, dia 26/05/2017.kkkkkkk... Ou, talvez, algum dia depois desta data.rs Se viu um aviso logo no lado direito do blog, bem no início da página, sabe que as resenhas agora terão dias pré-fixados: toda segunda, quarta ou sexta-feira. Ocasionalmente, publicarei algo sábado e domingo. Esta é uma forma de me obrigar a ler mais. Estou lendo pouco demais para o meu gosto e quero me reorganizar para mudar isto. :) Sei que sou bem louca, pois tenho que estudar, trabalhar, escrever meus próprios textos (livro, contos etc), ler, resenhar, atualizar a rede social do blog, responder emails, assistir novelas, filmes, três séries e fazer várias outras coisas.kkkkkkkkk... Aí ouço alguém dizer: "Não leio porque não tenho tempo" ou "Não leio porque não tenho o tempo que você tem pra ler" e sinto imensa vontade de esganar a pessoa.rs 

Como hoje (dia 24/05/17) quero escrever e publicar o texto para o tema do Projeto Escrevendo sem Medo, esta resenha só estará disponível na sexta-feira. 

Bjs! 

23 de maio de 2017

Conto de Escola - Machado de Assis (conto)


Contos Escolhidos - 2/30

Machado de Assis é um dos mais renomados contistas da literatura brasileira. Transitando entre os diversos tipos de contos - do tradicional ao moderno -, seus textos são originais e complexos. São contos cheios de acontecimentos intensos - quase sempre envolvidos num clima de tensão -, repletos de personagens polêmicos e ambíguos e de jogos e armadilhas textuais que induzem à dúvida, relativizando a maior parte das ideias e levando o leitor a refletir sobre suas "certezas". 




Palavras de uma leitora...



- Sei que eu falei que não faria resenha de todos os contos presentes no livro Contos Escolhidos, mas somente daqueles que me interessassem muito, lembram? O que posso fazer se o segundo conto também me encantou?! :)

Não posso dizer que sempre fui uma leitora de contos, pois seria a mais completa mentira. Tirando os contos de fadas (que amo demais!), nunca tive muito interesse em ler contos. Mas, nos últimos anos, mudei muito como leitora e escritora, e, uma vez que passei a escrever contos, decidi lê-los também. Meu escolhido foi o Machado de Assis. E confesso que não esperava que fosse ser uma escolha tão acertada! Como pude esperar tantos anos para ler este autor? Que estúpida! 

Conto de Escola é o segundo dos trinta contos que fazem parte deste livro que tem me acompanhado desde segunda-feira. Nos traz o drama de Pilar, um menino traquinas como muitas crianças de sua idade que, num determinado dia, toma a equivocada decisão de ir à escola.rs

Ele não tinha muita vontade de assistir às aulas daquele dia. Preferia brincar com os outros "vadios", curtir o dia lindo que se apresentava. Mas... a lembrança do último castigo dado generosamente por seu pai, fez nosso protagonista pensar duas vezes antes de matar a aula. Desta forma, desanimado, ele foi para a escola. Péssima decisão!rs Bem... Considerando o que se passou naquele dia, tenho que admitir que ele realmente não deveria ter ido à aula, coitado!

"Ora, foi a lembrança do último castigo que me levou naquela manhã para o colégio."

- Durante a aula, que o professor mal estava se preocupando em ministrar, um menino chamado Raimundo, filho de seu severo "mestre", lhe fez uma proposta. Algo simples, inocente, mas a tentação da recompensa oferecida era o problema. Se pegos as consequências não seriam nada agradáveis.

"Em verdade, se o mestre não visse nada, que mal havia?"

- Sinceramente, senti imensa pena do Pilar. O garoto já não queria ir à escola, tomou a decisão de não ir curtir o dia brincando por medo de apanhar.rs Mesmo assim cumpriu suas tarefas prontamente e aí, quieto no seu canto, acaba envolvido numa situação que não demora a lhe causar grandes transtornos. Eu fiquei com muita raiva do delator, mas nada se compara ao que senti por aquele professor miserável! É "linda" a maneira de educar de certos professores de antigamente. Realmente admirável! Para não dizer todo o contrário, claro!

- Sério, achei um exagero o que o tal Policarpo fez. Que necessidade tinha de agir daquela maneira? Talvez exista quem discorde de mim, mas não vi mal algum no que os garotos fizeram. Onde estava a ilegalidade, a ilicitude que não enxerguei?! Não achei o acordo dos meninos sequer moralmente inadequado. Raimundo pediu algo ao Pilar, oferecendo uma retribuição, uma recompensa. Tanto o pedido quanto a retribuição foram inocentes. Não achei que foi algo "corruptível", como o Pilar meio que afirma no final. Foi extremamente inocente e banal. E a atitude do professor completamente desproporcional.

Sim, fiquei revoltada!kkkkkkkk... Penso que alguns valores são ensinados da maneira errada, o que acaba fazendo a mensagem se perder ou ser desprezada pela forma como ela foi passada. Enfim...

Quanto mais leio este autor mais apaixonada fico! Ele consegue transformar um conto, uma narrativa simples, despretensiosa em algo que vai muito além! Ele joga com as palavras, com as cenas, com a construção dos personagens...  isso é fascinante!

"[...] e foram eles, Raimundo e Curvelo, que me deram o primeiro conhecimento, um da corrupção, outro da delação; mas o diabo do tambor..."


Conto anterior:
Missa do Galo

22 de maio de 2017

Missa do Galo - Machado de Assis (conto)


Contos Escolhidos - 1/30


Machado de Assis é um dos mais renomados contistas da literatura brasileira. Transitando entre os diversos tipos de contos - do tradicional ao moderno -, seus textos são originais e complexos. São contos cheios de acontecimentos intensos - quase sempre envolvidos num clima de tensão -, repletos de personagens polêmicos e ambíguos e de jogos e armadilhas textuais que induzem à dúvida, relativizando a maior parte das ideias e levando o leitor a refletir sobre suas "certezas". 




Palavras de uma leitora... 


"Deus me perdoe, se a julgo mal. Tudo nela era atenuado e passivo. [...] Não dizia mal de ninguém, perdoava tudo. Não sabia odiar; pode ser até que não soubesse amar."

- Este é um conto bem curtinho mesmo, que logo no início nos apresenta o protagonista Nogueira e suas lembranças acerca de um acontecimento que lhe marcou a vida. Algo que, embora pudesse parecer insignificante para alguns, permaneceu em sua memória apesar do passar dos anos. Algo que ele jamais entendeu. Uma conversa. Uma simples (talvez nem tanto) conversa com uma mulher às vésperas da missa do galo. 

Ele já a conhecia. Mas, depois daquela noite, era possível que julgasse que nunca a tinha conhecido de verdade, tamanho o contraste entre a mulher reservada e infeliz e aquela que se aproximou dele inesperadamente e, sentando-se ao seu lado, lhe mostrou mais de si mesma do, quem sabe, jamais mostrou a ninguém. Seriam as duas a mesma pessoa? Quem, de fato, era Conceição? A verdade é que ele não sabia. Tudo o que tinha certeza é que, passasse o tempo que fosse, não conseguiria tirá-la de sua cabeça. 

"Há impressões dessa noite que me aparecem truncadas ou confusas. Contradigo-me, atrapalho-me. Uma das que ainda tenho frescas é que, em certa ocasião, ela, que era apenas simpática, ficou linda, lindíssima."

- Nogueira tinha apenas dezessete anos quando a misteriosa e marcante conversa ocorreu entre ele e Conceição, esposa de um primo seu, e a dona da casa na qual ele estava se hospedando naquela época. Era um estudante como outro qualquer, jovem, ingênuo e curioso. Naquela noite de Natal, seu maior desejo era assistir à missa do galo e, impaciente, recusou-se a dormir, preferindo a companhia de um livro enquanto não dava a meia-noite. 

Foi assim que ela o encontrou. Conceição já deveria estar dormindo, pois era muito tarde. Estranhamente porém, ela resolveu se juntar a ele e conversar com um rapaz que praticamente ignorava enquanto estava em sua casa. Alguém por quem ela jamais demonstrou qualquer interesse. Mas naquela noite tudo foi diferente. O marido dela havia saído, como sempre, para ir ao "teatro" (traí-la com a amante, em outras palavras) e todos na casa estavam dormindo. Trajando um roupão branco e com um brilho diferente no olhar, ela entrou na sala, surpreendendo-o e enfeitiçando-o, provavelmente sem ter a menor intenção de fazê-lo. Aquela era uma mulher que, talvez contagiada pelo clima de Natal e os mistérios da noite, ousou, uma única vez na vida, mostrar quem realmente era. A mulher que mantinha presa em seu interior, que sufocava num casamento infeliz, sendo constantemente traída e não podendo fazer nada a respeito, por viver numa época em que dependia totalmente da "bondade" do marido para ter um teto sobre a sua cabeça. Eu acredito que naquela noite ela quis ser apenas ela mesma. Conversar com alguém que estivesse disposto a ouvi-la. Contar seus sonhos... mostrar que era muito mais do que a mulher que andava sempre apagada pela casa. Ela quis mostrar que era simplesmente... mulher.

Foi breve o momento. Fugaz. Mas tamanho foi o impacto que as palavras, os olhares perdidos e os gestos dela lhe provocaram, que Nogueira nunca pôde esquecê-la. Ele próprio não a julgava alguém especial, importante, antes daquela noite. A via como uma mulher comum e é até mesmo divertido observar como ele ficou impressionado com a mudança que ela sofreu naqueles minutos. Como ela pareceu diferente... esperta, viva, inteligente, mulher.

- Sei que este conto deixa muito à imaginação. Uma característica que adoro nos contos e parece ainda mais presente nos do Machado de Assis, segundo li, é o fato de contarem algo sem de fato contarem muito. rs Os contos deixam coisas em aberto, questões que podem ser interpretadas livremente pelo leitor. E isso é bem presente neste conto aqui. Tenho certeza que muitos leitores acharam que rolou sedução e flerte entre a Conceição e o Nogueira. Sinceramente, não vi as coisas desta maneira. Da parte dele, houve um interesse evidente. Ele ficou muito impressionado com ela. Atraído, como podemos observar por suas próprias palavras. Mas da parte de Conceição, não dá para saber ao certo. Só tive a impressão forte de que ela queria apenas ser ouvida, por alguém que realmente a escutasse. 

- Nunca na vida resenhei um conto.rs E me dá certo receio começar justamente por um do Machado de Assis, grande escritor do século XIX, leitura obrigatória na escola e na vida dos vestibulandos. 

Apesar de ter sido uma boa aluna na minha época de colegial, jamais tinha lido nada deste autor. Eu torcia o nariz e fugia dele como o diabo da cruz. Tinha pré-conceitos (sim, escrevi assim de propósito), achava que era leitura difícil e chata e, mesmo tendo conhecido "por alto" alguns dos seus escritos por causa das aulas de Literatura e dos vestibulares, não tive interesse em pegar num dos seus livros para ler. Até agora

- Estou numa fase "clássica".rsrs Os dois projetos dos quais estou participando este ano já desenvolveram papéis importantíssimos no meu crescimento como leitora e escritora aprendiz. O Desafio 12 Meses Literários, por exemplo, me deu a chance de ler um clássico que estava há séculos na minha estante e depois da leitura só posso lamentar por todo o tempo que desperdicei sem tê-lo lido. Lamentar por ter sido tão estúpida e adiado a leitura de um dos melhores livros que já li na vida: Orgulho e Preconceito - Jane Austen

- Missa do Galo é o primeiro dos 30 contos que fazem parte de um livro lindo que adquiri chamado Contos Escolhidos. Todos da autoria do Machado de Assis. Pretendo carregá-lo comigo na bolsa ao longo das próximas semanas e ir intercalando a leitura dos romances com os contos presentes nele. :) Não prometo que farei a resenha de todos, apenas dos que me despertarem maior interesse e carinho. Missa do Galo me conquistou por completo! E recomendo muito! É uma leitura rápida, deliciosa e que deixa margem a várias interpretações.rs 
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